quinta-feira, 24 de março de 2011

O MISTÉRIO DA DOR.



VOCÊ FALA DEMAIS! Ela disse isso sem raiva, sem querer magoar. Disse apenas o que sentia. De repente se fez silencio, a sala ficou muda e as bocas se fecharam. Um olhou para a cara do outro e não sabia o que dizer.Ela, que disse para mim, VOCÊ FALA DEMAIS, ficou constrangida, perdeu a tranqüilidade. Eu senti a sua dor. Não a dor por perceber que todos ouviram o que ela tinha falado, mas senti a sua dor interior, aquela que fica presa no profundo do ser, dor que estava gritando por silencio, com vontade de debruçar sobre a própria dor. Muitas vezes a gente quer ficar em silencio para tentar entender. Muitas dores vem para serem compartilhadas, necessitam de afago, de tapinha nas costas, de palavras de consolo, podemos até dizer que são dores sociais. Mas há dores que querem ficar isoladas, escondidas, com medo de não serem aceitas. É como aquela criança feia, machucada, que tem vergonha de mostrar a cara para os outros.

O mistério da dor é tão intrigante que Adelia Prado chegou a afirmar que a dor não tem nada a ver com amargura. Podemos sofrer e ser alegres, cultivar a dor e ter o os olhos com o brilho das estrelas, e Adelia ainda afirma que cada dia a dor fica mais rica de humanidade. Que idéia maravilhosa a de que a dor se enche de humanidade. Charles Chaplin, o inimitável Carlitos, gênio do cinema antigo, dizia que para poder rir verdadeiramente devemos estar disponíveis para apanhar a nossa dor e brincar com ela. Brincar com a dor, fazer dela companheira de caminhada, tomá-la pela mão como duas crianças no jardim de Alá, correndo por entre as flores e soltando risos ao sol. A idéia é não levar a sério o que a dor quer nos falar porque ela pode embaralhar os sentimentos e misturar as sensações.

A minha amiga não é a única que sofre pois a dor é comum à humanidade, todos nós algum dia vamos tê-la em companhia, até Jesus, o homem que não teve culpa, o Santo de Deus, sofreu sua visita. E Ele ao invés de se desesperar usou-a como instrumento de educação e de salvação. Mil novecentos e setenta e cinco anos depois, Adélia, mulher que é apenas um dia mais velha do que eu, acha que tudo que acontece é feito pra gente aprender cada vez mais, é pra ensinar a gente a viver.

Tirar lição das coisas que acontecem, como o aluno que aprende com sofrido esforço, deveria ser uma coisa comum na nossa vida e que nos ensinasse a viver. Os ascetas ensinam maneiras para aliviar a dor causada pelos contratempos da vida. Até a História aconselha a usar de experiência anteriores para não mais cometer o mesmo erro, a usar a própria dor para dela tirar lições para o futuro.

Estou aprendendo com a minha dor e com a dor dos outros, pois todos tem a sua dor e o seu sofrimento. Talvez a minha dor me faça falar demais para amenizar as lágrimas que ele provoca ou esconder as chagas e cicatrizes que ela provocou.

Eu poderia olhar nos olhos de minha amiga e dizer, como Tagore, o poeta indiano, quando eu estiver contigo no fim do dia,poderás ver as minhas cicatrizes, e então saberás que eu me feri e também me curei.

0 comentários:

Postar um comentário